Suicídio: um ato de coragem ou covardia?

Um dos temas mais polêmicos e de difícil compreensão presente em nosso cotidiano, a palavra suicídio pode ser definida como “ato de matar a si mesmo”. Segundo registros, o surgimento do termo ocorreu em meados do século XVIII, mais precisamente em 1737 através de Desfontaines, na França.

A estrutura do suicídio

Por mais que consideremos o suicídio como algo banal e pequeno, compreendê-lo levando em conta suas causas não é fácil. Para melhor entendimento, é importante perceber o ato em si através de sua estrutura. O suicídio possui quatro etapas e cada uma delas, representa um conflito muito intenso para o indivíduo que nele passa. As etapas são: ideação, planejamento, tentativa e execução. A primeira etapa, chamada de ideação suicida é o momento o qual o indivíduo tem seu contato inicial com o suicídio, mas isso não faz dele um suicida em potencial. Essa etapa geralmente vem através do pensamento e, em determinados momentos, na fala. A ideação é muito presente na maioria das pessoas, afinal, ela aparece envolta de uma entonação rebelde e é bastante corriqueira: “Não aguento mais essa vida, preferia morrer logo!”. É bastante comum em pessoas esgotadas sentimentalmente.

Considerado o pontapé inicial para o ato, o planejamento suicida é a segunda etapa. É através do início desta e, principalmente, do êxito que o indivíduo passa a ser considerado um suicida em potencial. O planejamento representa um momento conturbado internamente; ao mesmo tempo, uma fase de pura inspiração e afloração de inteligência psíquica daquele que planeja acabar com a própria vida. Ocorre através de planos mirabolantes minuciosamente focados na forma, na hora, no cenário, enfim, em todo conjunto da obra.

Após passar por essa fase, vem a terceira etapa, a tentativa suicida. De todas as fases, a mais complexa. É o momento de colocar em prática a ideação e o planejamento. Tal prática segue a risca certeira a sua perturbada teoria. Se nas fases iniciais o suicida usa de muita inteligência, calculismo e frieza, na tentativa ele é tomado de emoções e sentimentos (ruins) à flor da pele. Não tem hora pra pensar, agir ou tentar esquecer o que idealizou, o que tentou.

Se ele passou das duas primeiras fases, ele chegará sem dúvida para a tentativa. Entretanto, esta etapa não lhe dá a garantia do sucesso, do que tanto busca, que é acabar com sua vida. Nem toda tentativa suicida tem êxito. E se não tiver êxito, mais cedo ou mais tarde, certamente tentará novamente até conseguir.

Por fim, a execução suicida, o ato consumado. Essa etapa encerra todo esse ciclo conturbado e representa para o suicida a resolução de seus problemas. Segundo estudos, a tentativa só tem êxito quando o planejamento é bem elaborado. É importante conhecermos essas etapas, pois através dela sabemos identificar aquele que pode ser um suicida em potencial e, principalmente, tentar alguma forma de intervenção, o que não é nada fácil.

O lamento: um pedido de ajuda ou o famoso “piti”?

“Eu vou me matar!”. Sem dúvida, é uma das falas mais subestimadas e desvalorizadas que possa existir. Talvez nem mesmo o mais tolerante e atencioso romântico valorize essa fala. No final das contas, ela será sempre subestimada. Muitos a definem como “coisa de doido que quer chamar a atenção” ou o famoso “piti”.

Porém, diferente do que muitos pensam, essa fala é de suma importância, pois pode servir como uma forma de intervenção e acabar desconstruindo a ideia de acabar com a própria vida. Independente se ela surge inúmeras vezes antes do ato ou apenas uma, é imprescindível o olhar clínico. É através dela que você pode compreender os motivos que levam ao suicídio e, assim, arquitetar uma forma de prevenção e tratamento.

Importante que fiquemos atentos para as frases de alerta: “Eu preferia estar morto”, “Eu não posso fazer nada”, “Eu não aguento mais”, “Eu sou um perdedor e um peso para os outros”, “Os outros serão mais felizes sem mim”.

Quais são as causas que levam ao suicídio?

A causa mais comum está ligada é a depressão. Se a mesma consome o indivíduo fazendo com ele só tenha fatores de riscos envoltos em seu cotidiano e, que assim, perca todos os fatores de equilíbrio – ainda que esteja estabilizado terapeuticamente – as etapas suicidas serão um breve percurso.

Um surto psicótico e uso excessivo de álcool e droga podem ser considerados causas. Fatores extrínsecos sem a depressão latente podem também levar ao ato, tomando como exemplo um portador de câncer, AIDS ou quaisquer outras doenças físicas que minimizam a expectativa de vida.

É importante também saber que nem sempre uma desilusão amorosa, uma decepção no emprego ou um trauma podem gerar um transtorno psíquico, mas podem se tornar causadores imediatos para o suicídio.
Dados importantes

• Mulheres tentam o suicídio 4x mais que os homens, mas os homens têm mais êxito;
• Câncer, epilepsia, AIDS, uso excessivo de álcool e droga, depressão e esquizofrenia são as complicações mais comuns;
• Faixa etária entre 15 – 35 anos e acima dos 75 anos;
• Residentes em áreas urbanas;
• Desempregados;
• Isolamento social;
• Migrantes;
• Recém separados e viúvos.

É importante ressaltar que nem todos os indivíduos que se enquadram nas opções acima fazem parte do grupo de risco, isso não é regra geral. São apenas dados relacionados ao caso. Contudo, estudos em diferentes regiões do mundo têm demonstrado que, na quase totalidade dos suicídios, os indivíduos estavam padecendo de um transtorno mental.

O perfil do suicida

Existem três características peculiares que formam o perfil de um suicida: ambivalência, impulsividade e rigidez/constrição.

Ambivalência: é uma atitude interna daquele que pensa em morrer o tempo todo, mas também em viver. O predomínio do desejo de viver sobre o desejo de morte acaba possibilitando a prevenção.

Impulsividade: o suicídio também pode ser um ato impulsivo sem quaisquer causas latentes, o qual é influenciado somente por eventos negativos e/ou ruins do dia-a-dia.

Rigidez/constrição: a consciência do individuo passa a funcionar de maneira dicotômico: é tudo ou nada. Pensamentos, sentimentos e ações são voltados única e exclusivamente para o suicídio.

Como ajudar alguém sob o risco de suicídio?

O suicídio é algo que, no geral, não pode ser previsto e sua intervenção é muito complexa, tampouco não existe um protocolo universal a seguir. Contudo, existem alguns indicadores, como ideias expostas, tentativa anterior, disponibilidade de meios para o ato, preparação precoce de testamento, histórico familiar, luto constante e persistente pela perda de alguém próximo, pessimismo, falta de esperança, entre outros.

O contato inicial é imprescindível. Uma conversa num local apropriado pode ajudar e muito a desconstruir a ideia suicida. Outro passo importante é tempo reservado. Durante a escuta de um lamento suicida, jamais poderá demonstrar a ele inquietude e impaciência, pois são sentimentos que possam potencializar o desejo.

Ouvir efetivamente é uma tarefa importante nessa hora. No fim, o objetivo é preencher uma lacuna criada pela desconfiança, desespero e falta de esperança. Abordar envolto de calma, aceitação, respeito, cordialidade, valorização na fala, empatia com as emoções e, principalmente, a manutenção do sigilo são ótimos pontos para uma desmistificação do suicídio, assim dizendo.

O que não fazer?

Pontos que jamais podem ocorrer durante uma intervenção: ignorar a situação, ficar chocado ou emocionado, falar que tudo ficará bem sem ter qualquer atitude que demonstre isso, desafiar a pessoa a seguir em frente, dar falsas garantias e deixar o sujeito sozinho. Bom, é isso. Espero que você, leitor, nunca necessite desses conselhos, tampouco passe por isso, seja com a família, amigos ou consigo mesmo!

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